Abro este tema afirmando que toda escolha que faço – mesmo
sendo a mais pensada, ponderada, experimentada por suas variantes – é provida
de alguma perda. Ninguém ganha tudo em uma escolha. Outrossim, qualquer valor
só é valor graças a perda de outros valores que se tem de sofrer afim de
obtê-lo.
O homem moderno, o do século XX, em busca de certezas, fez
da ciência e do conhecimento experimental a sua maior escolha e, portanto,
atrofiou a sua sensualidade, tornando seu saber mecânico, em um sofisticado banquete, mas que não tinha tempero algum. Uma abstração carente de emoção. Por isso se
prestou tanto prestígio de que hoje ainda goza, em certos círculos, a
famigerada “inteligência emocional”.
Já, na pós-modernidade, esse mesmo homem avaliando seus ganhos
e perdas descobre que, geralmente, precisa exatamente daquilo que mais lhe
falta. E como encontrar o “isso” se a religião não satisfaz o homem pós-moderno
e nem a ciência dá sentido pleno a sua existência? Essa é a grande crise da
pós-modernidade: encontrar uma síntese entre felicidade e segurança. Mas como
organizar o seu pensamento quando toda segurança só pode nascer de toda
certeza, e toda felicidade só da plena liberdade (inclusive liberdade de
certeza)?
A gangorra entre a liberdade que lhe trás a felicidade e a
certeza que lhe dá segurança é impulsionada para píncaros na busca frenética da existência plena de significado. Qualquer tentativa de um equilíbrio será
apenas estagnação suicida que coxeia entre as seguintes fronteiras: a certeza
cativa da liberdade e a felicidade filha da segurança que, ao fazer uma opção
de qualquer uma delas, não compensa por serem ambas episódicas. Sem dúvida: a
liberdade sem segurança não assegura mais firmemente uma provisão de felicidade
do que segurança sem liberdade.
Observando a avalanche histórica da modernidade é possível
notar que os seus mal-estares provinham de uma espécie de segurança que
tolerava uma liberdade pequena demais na busca da felicidade individual. Já, os
mal-estares da pós-modernidade provêm de uma espécie de liberdade de procura de
prazer que tolera uma segurança individual pequena demais.
Nesse abismo dialético é que esse homem se encontra hoje. A
decisão que ele toma – e tem tomado – é de não fazer escolha alguma; como se
isso já não fosse uma escolha. Daí encontrá-lo vago, vazio; sem projeto, arte,
ícones, mitos ou gênios. A sua única certeza é de que ele ainda não fez a sua
grande escolha e nem sabe se a fará. Não há nele nenhum apetite para esse tipo
de avaliação porque isso não garante que esses valores diagnosticados suportem
necessariamente um estado permanente de satisfação. É nessa estagnação suicida
que ele encontra a desconstrução do grande edifício de seu mundo.
Cícero Brasil Ferraz