Relacionar-se com alguém exige coragem social. Falo
isso por que, embora sejamos seres gregários e, portanto, necessitados de viver
em “tribo” para a própria formatação do indivíduo como indivíduo, através
experiências amargas da vida e, portanto, desde o abandono primal, necessitamos de
precaução e cuidado ao viver com esse “outro” de que tanto carecemos. A isso
chamamos de “medo da vida”.
Dessarte, para “viver” é necessário “temer”. Seja o
medo de viver por si mesmo, seja o medo de ser “outra vez” abandonado (como
fomos abandonados pelo útero da nossa mãe, seu seio e, por fim, por seu colo)
ou, ainda, medo de depender de alguém. É nessa angústia paradoxal do “preciso”,
mas, “não devo me entregar tanto” é que partimos para os nossos “encontros da
vida” onde todo o nosso universo relacional se encontra sobre o alicerce paradoxal do medo.
E por ser paradoxal, não é contraditório é, antes, funcional e promotor das
relações minimamente saudáveis. Contudo, para nos realizarmos enquanto “eu
espelhado”, (um “eu” em relação ao “rosto” do outro) precisamos enfrentar esses
temores, e ter consciência de que, para crescer, não basta sermos nós mesmos,
mas é preciso participar da individualidade do outro ou, então, permitir que
essa individualidade nos penetre; sem o que muitos outros medos, podem se apoderar
de nós principalmente: o de sermos completamente absorvidos pela individualidade do outro, o
medo de perder a nossa individualidade, ou ainda o medo dessa alteridade nos
roubar a nossa independência. Na verdade, em última análise, um pouco disso
ocorrerá – a questão é o quanto somos nós mesmos para suportarmos o peso de um “totalmente
outro” entrando pelas células da nossa intimidade e, mesmo assim, sairmos mais
saudáveis, humanos e socializados desse “fascinante e tremendo encontro”.
Muitas das nossas fobias sociais e todas as suas
comorbidades advêm dessa divisa: temos muito mais dúvida do que somos do que
convicção daquilo que queremos; ou seja, será que queremos jogar um jogo tão
arriscado assim? Vale a pena, na busca da intimidade relacional, correr o risco
de perder a independência, ainda que infantilizada e fóbica? Vale a pena ser
mais solitários que solidários? Mantermo-nos afastados do “interior da vida fechada”
dos verdadeiros “acontecimentos”, conservar a nossa superficial paz de espírito
ou vivermos “entre muita gente” solidária e engajadamente identificando-se com
o “outro” em todas as suas instâncias?
Como seres criados “para”, não encontramos tudo o que
precisamos de humano em nós mesmos. Nosso destino, bem como o estímulo vão para
o prazer funcional que está no fato de realmente conhecer e conviver com alguém
– ainda que nos seja doloroso e arriscado. Toda pessoa madura já passou por
esse caminho correu esse risco, e colheu os seus frutos.
Por medo, muitos corajosos mas, psicologicamente
infantis exibiam coragem física, instintiva e animal, ao invés de se deixarem
conhecer fogem, quando agridem, machucam e matam.
Aqueles que têm “coragem de ser” (Paul Tilich) se
deixaram viver e se deixaram morrer em favor de um “outro” qualquer ou de uma
verdade. Quem tem autonomia sobre a sua vida tem-na também de sua morte. Essa é
a ultima coragem a única verdade e a razão do “tudo da vida”. E eu, nunca vi ou
li sobre alguém, que se arriscou a esse ponto, ser infeliz ou decepcionado com a vida porque assumiram esse risco de viver no absoluto de si-mesmo, em busca de uma
vida mais rica ao encontrar o seu próximo com toda sua riqueza individual. E o
melhor é que essa percepção não é in
abstracto e, sim, uma fusão dinâmica interacional e imediatamente social.
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