Assuntos

18.9.13

OPÇÕES ABERTAS

No jogo da vida pós-moderna, as regras - em todos os níveis - não param de mudar no curso dessa "disputa". O segredo - como nada mais é permanente - é manter sempre a certeza, a cada jogo, de uma constante fracionalidade através de sub-etapas estreitas e breves, o que possibilita mudanças de estratégias e rumos. Ou seja, cortar o presente nas duas extremidades, superando-o do passado e do futuro. O que importa é o agora, é o momento, a experiência do fato, enquanto só experimentado no ato. Não há mais o que chamávamos, até o Séc. XX, o movimento continuado do fato de "ir para a frente" ou "ir para trás". Essas direções dimensionais não existem mais; morreram com o surgimento da cultura pós-moderna e por causa dela.
Uma vez que, para aquelas dimensões abandonadas não exista mais um vetor, uma seta, um fluxo qualquer com qualquer direção, o tempo já não estrutura o espaço. O homem do "agora" não se sente indo "para", que lhe importa é somente se mover, sem exatamente a busca de um destino. O que importa é assimilar a experiência quando-no-agora ela chega. Por conseguinte toda a demora, até a "demora de satisfação", perde o seu significado, porque não há nenhum mensurador disponível que possa detectá-la. O homem pós-moderno tenta, a todo custo, isolar o presente da história.
Quem não tem história (um passado para o futuro) perde o que é de mais valioso no seu ser: A capacidade de ser reconhecido fora de si mesmo, quando se comparado com algo ou alguém da história e, portanto, assim, sem possibilidade de se lançar no futuro como algo ou alguém possível. Aqui é que ele perde o significado da identidade, pois ela só pode ser apreendida como tal "em relação a" ou com alguma correlação quando se volta para o passado ou se lança para o futuro. O silogismo que aqui se impõe: Se esse homem separou o presente da história ele não pode se comparar a nada e nem a ninguém, ergo, sua identidade se fracionou entre os espasmos de um movimento sem rumo. Aquele mundo moderno do passado constituído de relações e objetos duráveis deu lugar a um outro onde as pessoas e coisas são disponíveis e projetadas para uma imediata obsolescência. Também, à vista destas novas relações pessoais, nossos gostos e prazeres se tornam líquidos e, para logo depois, voláteis; foram metabolizados e liquefeitos no britador da renúncia do espaço e do tempo proposta pela pós-modernidade.
Mas nem mesma essa renúncia do tempo impede esse homem sem sombra enfrentar as crises deste tempo sem tempo. Digo isso pela razão de,  não havendo fato permanente, não haver por conseguinte, verdades permanentes. Se a verdade vai se fixar em alguma certeza, por não ser permanente, poderá voltar de "lá" novamente como verdade sazonal num dado momento fragmentado e provoca, assim, a mais incontrolável das crises, que é crise da certeza, berço de toda a insegurança e desesperança. Tudo vai-e-vem; volta-e-volta. Porque tudo que integrador no tempo e no espaço é baseado em parcerias, reciprocidades e em movimentos éticos, dinâmicos  duradouros.
Li, algures: "Como pode alguém viver sua vida como peregrinação se os relicários e santuários são mudados de um lado para o outro; são profanados, tornados sacrossantos e depois novamente ímpios, num período de tempo mais curto do que levaria a jornada para alcançá-los? Como pode alguém investir numa realização de vida inteira, se hoje os valores permanentes são obrigados a se desvalorizar para, amanhã, se dilatar? Como pode alguém se preparar para a vocação da vida se habilidades laboriosamente adquiridas se tornem dívidas um dia depois em que se tornaram bens? O que fazer, por não ter certeza de nada, quando as profissões e empregos desaparecem sem deixar notícia ( porque não há passado) e as especialidades de outrem são os antolhos de hoje?"
E concluo: como buscar ou criar uma identidade, uma face social num mundo que se fundamenta  na instabilidade das relações onde as regras que nos constituem sejam exatamente a de não haver norte, direção, fanal ou archotes? Como disse um de nossos poetas: "...pára mundo, que quero descer...".

Cícero Brasil Ferraz
    
 
 
 


3.9.13

"OS POBRES, SEMPRE TENDES CONVOSCO"

Quando o assunto é pobreza, nem tudo que se houve é, de fato, como se espera. Muitos há, especialmente os demagogos de plantão, que querem auferir desse filão dividendos políticos, plutônicos e/ou ditatoriais.
 Olhando pela perspectiva macroeconômica - e é o que queremos focar aqui -, a divisão rico-pobre é eufêmica pois, o que, de fato, existe é a dialética da cristalização entre "sedutores-seduzidos" e "opressores-oprimidos".  Vendo assim, os pobres se constituem em uma poderosa massa de manobra para a manutenção do status quo de tantos megalomaníacos, ditadores, amantes do poder e avaros. A velha divisão rico-pobre toma, por este modo de ver, um novo colorido, mas que contempla a mesma realidade: Para que a sociedade se mantenha como tal o pobre TEM que existir.
A manobra para a sustentação da pobreza é o consumo. Os ricos (tanto quando se trata de  indivíduos quanto se trata de nações) devem produzir para o consumo dos pobres somente o excedente. Isso se dá a partir de um marketing projetado para a adulação e sedução daquele (o pobre) que vai consumir e pagar com tudo que tem o que é sobra do produtor. O imperialismo e o colonialismo nunca vendem riqueza, só aquilo que foi produzido como seu excedente para lhes garantir  ainda mais riqueza; e, por mais estranho que seja, são os pobres, exatamente eles, que trabalham no fabrico do excedente que eles mesmos, depois, serão obrigados a consumir. Essa exploração da pobreza é dupla: tanto quando ele fabrica como quando consome. Daí a importância do rico manter a excelência do nível de emprego, melhores salários (mas nunca parte da riqueza), manutenção de estoques abastecidos, excelência nas relações interempresariais (B2B), entregas de produtos pré-programadas (just in time): Mis-en-scène de um mercado orientado para a fossilização da pobreza.
A plutocracia é a forma de governo que colocou todos os outros ideais políticos, religiosos e filosóficos sob seus pés. A linguagem mercadológica é o discurso preferido de políticos, chefes de Estado, gestores públicos, religiosos, filósofos, palestrantes e profissionais em geral. Todos se renderam a Mamom.
Atributos como "estar nervoso", "em calmaria", "agressivo", próprios aos seres humanos, agora, é também aplicado ao Todo Poderoso MERCADO; e porque a coisa se tornou o ser e o ser, então, necessariamente virou uma coisa.
Não existe nenhuma razão humanamente plausível para a manutenção redundante da pobreza; se a riqueza quisesse  a pobreza seria aniquilada; só não o é pelo prazer sórdido   de ver crescer a sobra, o excedente e o reciclável para ALGUÉM consumir.

Cícero Brasil Ferraz